segunda-feira, janeiro 17, 2011

As Brigadas Lúdicas sobem a serra.

Com Fotos de André Mantelli

O sol tímido despertando o domingo  no Rio não disfarçava o grande céu cinzento na direção da serra. O mini-ônibus partia do Circo-Sede da Crescer e Viver com 7 artistas entre palhaços, malabaristas, um fotógrafo e um músico, com Junior Perim à frente, organizando essa brigada lúdica. Segui com um pandeiro, alguns instrumentos de efeitos,  e representando nosso centenário Sindicato, observando de que maneira podemos engajar nossa participação nos próximos dias.

As paisagens da janela ainda na Baixada Fluminense disputam espaço com as que imagino encontrar no nosso destino. Os relatos de parte da equipe que um dia antes já estivera por lá nos preparam mais que o noticiário da TV, que os jornais.
Estrada adiante,  iniciamos a subida dentro daquela natureza grandiosa. Passamos pela entrada de Petrópolis, mais um pouco e chegamos a Itaipava, onde começam a aparecer os caminhões do Exército,  muitos carros com doações, muitos voluntários, numa manhã de trégua na chuvas,  mas em céu bastante encoberto.

Em Itaipava somos direcionados a fazer nossa atividade num abrigo no Vale do Cuiabá, para onde partimos, obedecendo a uma contínua e necessária triagem feita pelas autoridades no caminho. O desolamento da paisagem se aprofunda, a cerca viva ao lado da estrada, que antes cercava casas,  agora cerca o nada. Uma máquina de lavar pendendo de um galho de árvore da "nova" margem do rio nos dá uma idéia da tragédia.Colchões, chinelos, cadeiras, brinquedos, fogões, cadernos, espreguiçadeiras, automóveis dispostos no desordenamento imposto pela natureza implacável, que ainda assim prevalece em suavidade pela sua própria beleza.

Chegando ao local, um ginásio de um clube que se tranformou em alojamento abriga algumas famílias,com seus pertences que conseguiram recuperar e suas sentinelas vivas: seus queridos e fiéis "Hulks", "Shadows", "Rex's" e outros belos e nobres viralatas que serão suas casas onde elas estiverem. Suas casas são os corações dos seus donos.


Com  cabelos de fogo e olhos assustados de  água, o pequeno e machucado Caio nos recebe cumprimentando um a um. Do monociclo, dos malabares,  bolas, da alfaya, dos pandeiros, eles vão se acercando cumplices da alegria.
Guilherme quer ser músico. E vai ser dos bons: explorando o girassino, um instrumento percussivo com 5 notas de ré a lá , já descobriu algo parecido com "Frere Jacques", que ele conhece como "a música dos dedinhos, da Eliana".
Eduarda desenha casas lindas com canetinhas coloridas e me deu uma de presente.
Douglas mostrava o que aprendeu a tocar no pandeiro, na Igreja.

Mas num canto com a avó ao lado, com um psicólogo voluntário que atua na região, a Gabriela, irredutível chorava não querer saber mais de viver, quanto mais de palhaços, músicos, circo, pandeiro ou canção. Um choro mais de revolta que de dor. Revolta com a própria dor, com o próprio sofrimento. Para ela não tinha cabimento nenhuma alegria, até ser cortejada pelo Café Pequeno.

Café Pequeno, o palhaço,  faz surgir flores do chapéu, chegou com seu grande sapato, e o espetáculo começou, a trupe se desorganizou em círculo, a mulher mais alta do mundo, o monociclista, o malabarista, a palhaça amiga, o mestre de cerimônias..Hulk, Shadow e seus companheiros viralatas se transformaram em "Leões", os risos brotaram vivos em todos, e então reparei que Gabriela também gargalhava, sua beleza explodia em sorriso.
Aí quem quase chorou fui eu.


As Brigadas Lúdicas do Crescer e Viver, com a participação do SindMusi,  estão se organizando para novas ações ainda esta semana e nas próximas, e diferentes artistas poderão levar sua colaboração aos que precisam desse ânimo na alma, pra aguentarem a barra que estão passando.