quarta-feira, outubro 15, 2008

Leny Bello

Leny Bello

Ela é agitada, ansiosa, irrequieta e sincera. Ela rebate na lata, ela não te falta, ela está sempre pronta. Esse coração aberto de passo marcado, de compasso dividido por quantos for necessário. Essa mulher forte, amiga, leal, que nos apresenta os maiores valores que podemos esperar de uma amizade, carinho e verdade, chama-se Leny Bello.

Já se vão três anos do final de 2005, quando você se mostrou para mim uma grande amiga num momento de perda, com suas sinceras orações pela minha mãe.

Leny, minha querida. Dona Ruth recebeu suas orações, eu tenho certeza disso. Não sei se corações corajosos e generosos como os de vocês duas tem alguma espécie de “clube”, ou sociedade entre os diversos planos espirituais, mas ver nossa amizade, tudo o que você me ofereceu, o exemplo de vida, o entusiasmo, a energia, tudo me vem como uma encomenda de Dona Ruth.

Leny, a cada quarta feira que você ajudava uma entidade assistencial, você me ajudava também. Cada quarta era a “feira” de quinta e com ela eu pude contar durante todos esses meses. Nosso ciclo de Canto e Cantoria este ano inicia agora sua pausa exatamente quando novas oportunidades profissionais surgem para mim. E me dão a certeza de que mais valeu estar ao seu lado, da sua positividade, da sua garra e sinceridade, do que ter dado atenção a tristes vaticínios que tentaram impingir a meu futuro profissional. Meu tambor bate forte e para o bem! Meus “sérios problemas” agora são outros, como por exemplo, tentar conciliar uma agenda. E o de passar as quartas feiras sem sair daqui do Grajau de tardinha, pegando o rumo do Canto e Cantoria, para cortejar sua belíssima obra, minha querida. O ciclo da vida segue, novos ganhos e perdas virão, novas safras e entressafras, mas o que se consolida no coração não se esquece.

Muito obrigado, que Deus abençoe nossa amizade.

João Bani, 15 de outubro de 2008

quarta-feira, maio 21, 2008

Os Grandes Clubes não morrem



Dia de clássico interestadual decisivo no Rio. No Engenhão, Botafogo e Coríntians fazem o primeiro dos dois jogos entre os times, na semifinal da Copa do Brasil
Voltando de um ensaio, chegando com o carro cheio de instrumentos, vejo aquele bar onde há todo tipo de cerveja, todas geladas, ainda aberto. Para melhorar, o gerente ainda é conterrâneo , baiano de Valença, meu amigo Heron. O Rio de Janeiro tem uma identidade com a Bahia que diminui o eterno banzo de todo baiano longe de casa. E a descontração, a conversa de bar, tudo isso nos deixa mais à vontade. Heron é Vitória, e, como tal, aproveitando o bom tempo em que não nos víamos, alfineta com aquela gozação que estava guardada especialmente para mim, depois da conquista do bi-campeonato baiano pelo seu clube:
- Marrapaaazz... Eu nem comemoro tanto o bi campeonato...Bom mesmo é ver o Bahia 7 anos sem ganhar nada...” E cai na gargalhada...
Rio com ele, contrariado, mas rio com o Rio baiano que se mostra ali. Peço uma cerveja gelada, e aproveito para contra-atacar.
-Mas quero uma Original. Nada de genéricos...hehe
E o Rio vai desaguando então ,no bar, com dezenas de torcedores do Botafogo que chegam do estádio Engenhão, templo arrendado pelo clube para mandar seus jogos. Um estádio moderno, que foi construído em função do Pan-Americano do Rio. Os botafoguenses comemoram a vitória de 2 a 1 sobre o Coríntians, nas semifinais da Copa do Brasil.
Vejo a torcida do Botafogo e relembro um dos muitos bons momentos que passei e tenho passado ao lado da minha Vania, botafoguense, ovelha alvi-negra numa família onde seus pais e irmãos são flamenguistas. Era junho de 1989 , ainda vivíamos em Brasília, já havíamos juntado nossos sonhos e esperávamos nosso João Pedro ,que nasceria, como nasceu, no mês seguinte. Pois bem, naquela noite de 21 de junho de 89, um gol de Maurício acabava com o jejum de 21 anos sem títulos do clube da estrela solitária, em decisão contra o Flamengo. 21 anos. Poderiamos até dividir este número por cada um dos seus grandes rivais: Flamengo , Vasco e Fluminense...7 anos sem ganhar, a cada grande adversário.
Minha companheira era uma alegria só, e exigia minha participação na comemoração. Quase relutei a principio, pois, tricolor baiano desde o berço, apaixonado pelo meu Bahia, tenho no Flamengo o time de simpatia no Rio. Afinal se equivalem em seus estados como times de maior apelo popular, e como os maiores vencedores, de conquistas na base da raça, da mística. Mas minha simpatia pelo urubu carioca não era o suficiente para me impedir de comemorar junto com ela , solidário, o fim do jejum alvinegro. Afinal, alguns meses antes ela vibrara comigo acompanhando a grande conquista do meu Bahia no Campeonato Brasileiro. O amor é capaz de coisas assim pelo futebol, ou o futebol é capaz de coisas assim pelo amor?
O Botafogo de 21 anos de seca era alvo de chacotas de todos os torcedores adversários, inclusive minhas. O Valdir Espinosa se revelava ali um técnico habilidoso com o desacreditado material humano com o qual contava, e motivou seus jogadores de uma forma que eles conseguiram se superar. A superação é um bem de quem é grande , de quem nunca perde a majestade. De quem É, não de quem simplesmente está. Desde então, o Botafogo venceu mais 3 cariocas e o seu primeiro Campeonato Brasileiro, se igualando ao Bahia em conquistas nacionais, já que fora campeão da Taça Brasil de 1968.
O Bahia é e será um grande clube. Vai superar suas dificuldades. Me lembrei do exemplo do Botafogo para mostrar que os grandes clubes, grandes mesmo, nunca morrem, pois estão vivos, ainda que por 21 anos ou mais, nos corações de seus torcedores.
BoraBaheeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa

sexta-feira, abril 11, 2008

Rádio-Cabeça



O ônibus era puro barro, numa Brasília das primeiras chuvas, avenidas monótonas, paisagens que só o tempo deixava desiguais. Era preciso passar muitas vezes por elas para aprender a diferenciar cada quadra da outra, cada parada da próxima ou passada... A música na minha cabeça rolava entre Deep Purple e Noel Rosa. Os primeiros me haviam chegado muito tempo antes, pelos discos do meu irmão. O Poeta da Vila, por uma coleção mensal sobre MPB que tínhamos em casa.

Smoking “under” the water, quase como Jon Lord, Blackmore e tribo, com um cigarro aceso e quase molhando, mas sem mosquito para espantar quase como Noel, eu sem saber vivia o porque da música ser um traço definitivo na vida de certas pessoas. Diante do silêncio da capital nos anos 70, só Música para me fazer companhia nos percursos daqueles ônibus mudos e imundos. Eu desenvolvera em minha mente uma discoteca. Ainda não havia chegado o walkman, hoje eletrônico dinossauro. Rádio com “egoísta” poderia ser uma solução. Mas em stereo, com repertório próprio e com o arranjo destacando o que se queria, somente a Rádio Cabeça.

Morava na Vila Planalto, uma comunidade remanescente dos pioneiros da construção da Brasília, numa bela casa de madeira, com um grande quintal, numa família onde os discos juntavam o sertão de Luis Gonzaga dos meus pais, reminiscências da Jovem Guarda, Chico Buarque, Caymmi, Gal, Gil, Elis, Caetano, Stones, os já citados Purple e Noel, coisas da Motown...Era um ecletismo bastante saudável. Gosto muito do que ouvi. Hoje, sem sugerir uma palavra que os direcione, vejo meus filhos gostarem também de muitas dessas coisas. Descobriram na internet.

A mudança para Brasília, que ocorrera anos antes, fora um dado importante nessa musicalização. As interações culturais da cidade , com gente chegando de todo o país e muitos estrangeiros residentes, destacavam personagens da nova cena musical naqueles tempos ainda de regime militar, quando aconteciam pequenos filhotes de Woodstock nos Concertos ao Ar Livre que os chamados “agitadores culturais” promoviam nas entrequadras.

Mas na minha Rádio cabeça, no Norte daquela bússola onde imerso eu seguia olhando o céu de frente na Capital, naquela metade dos anos 70, um repertório novo surgia . Rose, uma das minhas irmãs, verdadeira Rosa dos Ventos Musicais, chegara em casa com um LP, Minas, de um cantor e compositor que então já era consagrado, mas que passara ao largo da minha Rádio cabeça durante algum tempo. Ouvi, e ouvia o Gran Circo de introdução triunfante, com harpas , com vocalizes do Pará em Fafá, as percussões ricas, o Trastevere me apresentando free jazz com vocais de catedrais. Os compassos compostos soando naturais, as Asas da Panair, o beijo Partido unindo Paula a Bebeto.

Minas , o disco, e Minas , a terra, me mostravam caminhos para tanto lugar... Com divisa relativamente perto do Distrito Federal, pelas bandas da obra de Guimarães Rosa, bem ali estava a Minas do peixe vivo, do Juscelino que gerara aquela Brasília onde embalava os percursos da minha Rádio imaginária agora ao som de um filho seu e sua turma.

Minas, o disco, me levou a Geraes, me resgatou o Clube da Esquina anterior que eu não conhecera, me impressionou com Raça. Me mostrou Journey to Down , viagem melhor que as bad trips de tantos heróis da época. Naqueles ônibus, eu pagava a passagem com um Tostão, One Coin, mais valioso que um milhão. Lília era trilha sonora da L-2, superquadras passando... Com Fé cega e Faca amolada eu enfrentava o vazio do Eixo Monumental. “Menino” me mostrava em barro as crianças largadas na Rodoviária, “Fazenda” era orvalho no seco Cerrado...E eu com o silêncio do ônibus, com gente tão calada nos bancos, tempos de regime militar...Que rádio estariam ouvindo, que programação teriam para animar o silêncio daqueles medos?

Pensei em escrever sobre isso para celebrar uma alegria espiritual e profissional que me tem sido ofertada há alguns anos. A de poder, eventualmente, colocar a serviço do maior hitmaker da minha “Rádio Cabeça” os meus tambores, minha música, o que não deixa de ser uma retribuição. Ele me deu a música, que a tome de volta. Há alguns anos, pela generosidade da confiança do amigo e mestre de percussão Marco Lobo, titular absoluto do time do Bituca, tenho tido oportunidade de participar de shows do Milton, como substituto. Na última delas, em Belo Horizonte, diante de uma multidão na Praça da Estação, tive a boa e velha Rádio Cabeça a me auxiliar , na lembrança daquela trilha sonora que me conduzira pelas ruas de Brasília e que afinal me levara até ali, àquele palco. Fosse futebol o ofício da minha alma e seria como estar em Santos jogando bola com Pelé.

A diferença é que nos jogos do time do Bituca, ninguém perde.

A Rádio Cabeça agradece.

terça-feira, janeiro 08, 2008

Admiral Eruditino







Admiral Eruditino


Admiral Eruditino nasceu no bairro do Santo Crítico , Rio de Janeiro.

Desde cedo, Admiral vivia um drama existencial, diante da sua sensibilidade que ,pelas circunstâncias da vida, tinha de enfrentar a obrigatória audição dos clássicos populares, verdadeiramente populares, que saindo dos alto falantes de rádios AM, enchiam o ambiente dos seu bairro de "música de baixa qualidade" para os conceitos de Admiral : Odair José, Nadinho da Ilha, João da Praia, The Fevers, Zé Rico e Milionário....

Com seu coração revolucionário compreendia a adoração daquela gente sem dente que o avizinhava por aquele tipo de submúsica: Nem todos tiveram acesso à sua leitura. Nem todos o deixaram jogar bola, mas os livros ficaram com ele. O jovem fã dos ícones da música engajada da sua época, aliás, logo percebeu que bom mesmo era ser ruim de bola: quanto mais caracterizado fosse o seu desprezo pelo esporte alienante, melhor.

Admiral , se não tinha gosto pelo esporte, tecia letras de Música Popular Brasileira, aquela que ele queria popular. Aprendeu um pouco de violão, mas o suficiente para que não fosse considerado um violonista: Ele era compositor. Ele era um revolucionário, tinha que tirar a beleza de poucos recursos, inclusive musicais.

Nisso, colecionava adjetivos irônicos para aquela música que ele desprezava, principalmente para os "culpados" por ela, no seu pretensioso entender.

Do que sei do Admiral é que ele cresceu, constituiu família e trabalhou em jornal, onde por muitos anos esteve, e fez amigos. A demissão veio, junto com uma indenização, o suficiente para se arriscar na gravação do seu primeiro CD. Com doze faixas, vaticinou que quatro, mais populares, quase uma heresia para seu passado, seriam "trabalhadas" junto aos inúmeros amigos que fizera na imprensa.

Implacáveis amigos.

Seria melhor que não escrevessem nada sobre seu disco , que seriam mais amigos: "Letras desprovidas de sentido, num agrado inexplicável ao Axé" ou "Numa toada enervante, de forte acento sertanejo, nos faz crer que uma espingarda de cano duplo seria suficiente, se Admiral tivesse parceiro".

Admiral, convencido pela força da bruta realidade, esqueceu-se da música mas não dos adjetivos a serem aplicados a quem a faz: Hoje é crítico de música em jornais da Internet e ocasional em listas de discussão.

Seu disco faz um sucesso danado nos alto falantes da rádio comunitária do bairro de Santo Crítico: Tocam as quatro comerciais faixas "de trabalho".